12 de julho de 2021
Nossos direitos estão sumindo do vocabulário do Congresso
Monitorar os direitos das mulheres no Congresso em 2021 é observar não só os projetos de lei que parecem óbvios nos retrocessos ou avanços, a movimentação dos congressistas conservadores também está nos detalhes. Há algum tempo, por exemplo, eles se articulam para excluir de projetos de lei alguns termos que para eles são "feministas demais". "Saúde integral", "planejamento reprodutivo", "direitos sexuais e reprodutivos". Na prática, querem fazer os nossos direitos sumirem do vocabulário, das normas, das leis. E essa é mais uma tática para a qual precisamos estar atentas.

Na semana passada, por 25 votos a 21, foi aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família o substitutivo da deputada Chris Tonietto (PSL-RJ) para o PL 853/2019, da deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que cria a Semana Nacional de Conscientização sobre os Direitos das Gestantes. Segundo o texto original, a data seria usada para divulgação de direitos como assistência humanizada à mulher durante a gestação, pré-parto, parto e puerpério, além dos direitos trabalhistas e sociais. A primeira relatora do projeto, a deputada Vivi Reis (PSOL-BA), havia apresentado um primeiro substitutivo ampliando o projeto, mas Tonietto e os deputados conservadores da comissão não gostaram.

O problema seria justamente o "uso de terminologias/expressões de cunho ideológico que caminham na contramão da proteção à gestante", nas palavras do parecer de Tonietto, dentre elas o uso de “planejamento reprodutivo”. Segundo a deputada, por exemplo, esse é um termo que vem sendo utilizado para fomento e viabilização do aborto. Vale destacar que planejamento reprodutivo não tem nada a ver com aborto, trata-se de falar em políticas públicas de educação, orientação profissional e fornecimento de métodos contraceptivos para que mulheres possam decidir quando querem ser mães, evitando gestações indesejadas.

Após manobras, a deputada apresentou um substitutivo suprimindo esses trechos e ele foi aprovado em uma votação nominal apertada - no link você pode ver quem votou contra e a favor. O projeto, que não precisa passar pelo plenário da Câmara, ainda vai ser avaliado pela Comissão de Constituição e Justiça.

Esse não é um caso isolado, como temos mostrado aqui mesmo, na newsletter, nos últimos meses. Tentam substituir termos como "paridade de gênero" por "igualdade entre os sexos". A palavra "gênero", no geral, é demonizada entre congressistas conservadores. Mas eles vão além, querendo tornar problemáticas outras expressões que garantem nossos direitos básicos, como fazem com "profilaxia da gravidez", que acusam de abortista. E preocupa que, de pouco em pouco, eles venham conseguindo, já que se articulam para barrar o avanço dos projetos que tenham esse vocabulário.

Grandes retrocessos escancarados em projetos de lei, como o Estatuto do Nascituro, por exemplo, geram mais mobilização e, por isso, são vitórias difíceis para eles. Mas também podemos perder garantias legais aos nossos direitos nesses pequenos detalhes. Se “planejamento reprodutivo” sumir de todas as leis, o que vai garantir o fornecimento de anticoncepcionais, por exemplo?

O jeito é: 1. monitorar tudo que acontece não só no plenário, mas também nas comissões e nos bastidores do Congresso; 2. garantir que tenhamos mais mulheres e parlamentares que lutam pelos nossos direitos em todos os espaços do legislativo brasileiro. É para isso que estamos aqui.

Um beijo,
Bárbara Libório
Idealizadora e Coordenadora do Elas no Congresso
Não é fácil...
Fazer esse monitoramento minucioso, combinando-o com análises e contexto para tornar o que acontece no legislativo acessível a todas não é fácil - e nem barato. Precisamos de você para que o Elas no Congresso e todos os projetos da AzMina continuem existindo. Só assim vamos garantir que os direitos das mulheres continuem avançando. 
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Radar da Câmara
Pauta. Está na pauta do plenário da Câmara para esta semana a votação do requerimento de urgência para o projeto de lei que disciplina as atividades de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância de gestantes. Além disso, o plenário também pode discutir o PL 301/2021, que endurece a repressão nos casos de violência doméstica e prevê, entre outras coisas, o aumento da pena nos casos de crimes contra a honra previstos e de ameaça quando praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Pandemia. A bancada feminina se mobilizou e aprovou na Câmara o projeto de lei do Senado que determina a inclusão, como grupo prioritário no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, de gestantes, puérperas e lactantes, assim como de crianças e adolescentes com deficiência permanente ou com comorbidades, além daquelas privadas de liberdade. Deputadas distribuíram camisetas e adesivos em defesa da proposta, cuja votação foi acompanhada de perto por mulheres que atuaram em defesa da vacinação prioritária. Vale lembrar que em algumas cidades e estados a imunização desses grupos já está acontecendo.

Violência contra a mulher. A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher aprovou o PL 6363/2019, que prevê atendimento integral e multidisciplinar para quem pratica a violência doméstica e familiar - sim, para os agressores. A lei altera a Lei Maria da Penha e prevê a construção de centros de educação e reabilitação. Ela ainda traz uma série de medidas para a assistência das mulheres e crianças vítimas de violência doméstica, entre elas a construção de casas-abrigo e de centros de atendimento integral e multidisciplinar. O projeto ainda precisa ser aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça.

Já a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou proposta que determina a perda de cargo, mandato eletivo, função ou emprego público caso a pessoa seja condenada a mais de um ano de prisão por crimes envolvendo violência doméstica e familiar contra mulher, criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.

Aborto. O deputado Loester Trutis (PSL-MS) quer prever como crime, quem, de qualquer modo, criar, produzir, divulgar, incitar, reproduzir, distribuir ou financiar por meio digital, rádio e televisão, ou em materiais impressos, mesmo que de forma gratuita, campanhas de incentivo ao aborto.

Gestantes. O deputado Pastor Sargento Isidório (AVANTE-BA) quer estabelecer o pagamento de dois salários mínimos às mulheres gestantes desempregadas e um salário mínimo e meio às mulheres gestantes empregadas, enquanto perdurarem os efeitos da pandemia do novo coronavírus.

E a deputada Rejane Dias (PT-PI) quer tornar obrigatória a notificação da existência de gravidez por aluna menor de 14 anos de idade, pelas instituições de ensino públicas e privadas.
Saúde. O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) deu parecer favorável ao PL 119/2019, que inclui no campo de atuação do Sistema Único de Saúde, o SUS, a atenção humanizada à saúde da mulher, listando as situações em que se aplica: mortalidade materna, abrangendo precariedade da atenção obstétrica, abortamento em condições precárias, precariedade da assistência em anticoncepção, DST/HIV/Aids e violência doméstica e sexual; saúde de mulheres adolescentes; saúde da mulher no climatério/menopausa; saúde mental e gênero, doenças crônico degenerativas e câncer ginecológico; saúde das mulheres negras; saúde das mulheres indígenas; saúde das mulheres lésbicas; saúde das mulheres residentes e trabalhadoras na área rural; e saúde das mulheres em situação de prisão.  O PL já passou por outras comissões onde houve uma discussão sobre se elencar as situações em lei poderia culminar na exclusão de algumas delas. A proposta seria abranger tudo isso dentro do termo "atenção humanizada". Na CCJ, o substitutivo apresentado pelo relator manteve o texto original.

A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher aprovou o parecer favorável e o substitutivo da deputada Lauriete (PSC-ES) ao PL 3553/2020, que institui diretrizes para serviços de proteção e atendimento especializado a gestantes dependentes químicas.

Parentalidade. A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher pediu para analisar o PL 1974/2021, de autoria de Sâmia Bomfim, que dispõe sobre o instituto da parentalidade no Brasil e todos os direitos dele decorrentes. A intenção é garantir que todas as pessoas que possuam vínculo sócio-afetivo, maternal, paternal, de adoção ou qualquer outro que resulte em responsabilidade na garantia do desenvolvimento e da sobrevivência em relação a uma criança ou adolescente tenham plenas condições de exercer seu papel de cuidador.

Efeito BK. O deputado Guilherme Derrite (PP-SP) quer proibir publicidade, por qualquer veículo de comunicação, que se refira a orientação sexual ou movimentos de diversidade sexual, que contem com a participação de crianças e adolescentes. Segundo ele, elas não têm maturidade suficiente para assistirem essas propagandas, "especialmente por serem essas carregadas de mensagens subliminares". 🙄

Esporte. A deputada Marina Santos (SOLIDARIEDADE-PI) apresentou parecer favorável ao PL 5267/2020 na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher. O texto cria o Programa de Igualdade de Gênero no Desporto para garantir equidade, participação, inclusão, acesso e representação das mulheres em todos os âmbitos e níveis da comunidade desportiva.

Trabalho. A deputada Maria Rosas (REPUBLICANOS-SP) quer criar o Selo Empresa Amiga da Mulher, a ser concedido às empresas que se destaquem na implementação de medidas de empregabilidade de trabalhadoras e na promoção e defesa dos direitos da mulher.

Transporte. O deputado Leonardo Picciani (MDB-RJ) quer oferta de ônibus exclusivo para mulheres em todas as linhas em operação de transporte público coletivo nas áreas urbanas.
Radar do Senado
Pauta. Está na pauta da semana a discussão do PL 5613/2020, que veda a propaganda eleitoral que deprecie a condição da mulher ou estimule sua discriminação. O texto orna crime a produção ou oferecimento de vídeo com conteúdo inverídico sobre partidos e candidatos, assim como divulgar esse tipo de conteúdo durante período eleitoral e aumenta a pena se envolver discriminação à mulher. Também prevê o crime de assédio a candidata e determina a proporção entre homens e mulheres nos debates entre os candidatos nas eleições proporcionais.
Erramos.
Na semana passada, por um erro de digitação, acabamos escrevendo que a deputada Sâmia Bomfim fazia parte do quadro de parlamentares do PSL na Câmara. Não é correto. Sâmia é deputada pelo PSOL-SP. Vejam a diferença que uma letrinha faz! 
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